Ao longo das décadas, a dramaturgia passou por constantes transformações, adaptando-se às novas formas de consumo de conteúdo. Do teatro ao rádio, da televisão ao streaming e às redes sociais, as narrativas se moldaram às tecnologias emergentes. No entanto, a ascensão do modelo on demand e a velocidade com que o público consome e descarta informações impuseram novos desafios a essa arte.
Considerado um dos nomes mais reconhecidos da teledramaturgia brasileira, Wolf Maya acompanhou essas mudanças de perto, tanto na frente das câmeras, como ator, quanto nos bastidores, como diretor.
Em entrevista ao Metrópoles, ele analisou o impacto dessa nova dinâmica no gênero e apontou que a queda de audiência das novelas se deve a um fenômeno natural da era digital: “As novelas estão sendo alvo de uma dispersão natural do tempo em que vivemos”, explicou o diretor, que está longe da TV Globo desde o início da pandemia, mas segue ligado à emissora por meio da Escola de Atores que leva seu nome.
Se analisarmos a situação da TV Globo, por exemplo, fica evidente — e comprovado por pesquisas — que as novelas têm perdido espectadores ao longo dos anos. De 2024 para 2025, segundo dados da Kantar Ibope, a audiência dos folhetins da emissora registrou uma nova queda.
“Nem vou dizer que a qualidade piorou, não. Mas, hoje em dia, por uma questão econômica, a televisão já não tem mais o mesmo investimento na produção das novelas”, observou Wolf Maya, lembrando que, durante sua trajetória na emissora, gravou em diversos estados e até em outros países.
Para ele, a forma como o público enxerga a TV aberta mudou significativamente com o avanço do streaming e a facilidade de acesso a conteúdos globais. “O streaming abriu as portas para o mundo. Hoje, qualquer pessoa pode ter contato imediato com diferentes culturas e formas de comunicação. O público da televisão aberta, basicamente, é o acima de 50 anos”, explicou.
Os jovens são o grande expoente dessa transformação. Acostumados ao ritmo acelerado das plataformas digitais, eles incorporaram a dinamicidade dos streamings ao dia a dia e passaram a consumir entretenimento de forma fragmentada e sob demanda. Nesse cenário, as novelas perderam espaço.
“A dramaturgia não faz parte muito do mundo adolescente. Então, ela já não tem o mesmo impacto de antes. Os jovens não têm mais tempo ou disposição para acompanhar um programa fixo por uma ou duas horas diárias. O formato de consumo mudou, e o público se readequou”, analisou o diretor.
As novelas no streaming
Apesar de nascerem, crescerem e se popularizarem na televisão, hoje há um movimento que leva esse tipo de produção para o streaming, como foi o caso de Pedaço de Mim, da Netflix, e Beleza Fatal, da Max, escrita por Raphael Montes. Wolf Maya classifica essa prática como “interessante” e “inteligente”.
“As empresas que estão chegando no Brasil, que não têm uma referência de intimidade com a nossa dramaturgia, com a nossa história, em vez de importar as histórias de fora estão criando isso”, disse, destacando um ganho por parte da dramaturgia nacional, no sentido cultural, de dimensionar e ampliar as possibilidades de boas obras, com o formato comum da cultura on demand.
O ator, diretor e professor opinou que a produção como costumamos ver, com 200 capítulos, não deve mais voltar ao que era antes e citou que grandes autores da televisão, acostumados em como essa roda gira, estão com dificuldades, buscando saídas para continuar com a dramaturgia de 100, 200 capítulos, num processo sequencial de exibição de oito, dez meses.
Wolf Maya explicou que as emissoras convencionais sofrem por conta dessa mudança, que trouxe uma evolução na comunicação e uma maior amplitude de captação e consumo. “A TV aberta perdeu aquela importância que teve, até antropológica, social e cultural do Brasil”.
Fonte: Metrópoles